Estamos em Nova York, na década de 1920. Um jovem chamado Frank Netter fazia ilustrações para dois grandes jornais da cidade, como um freelancer qualquer com uma remuneração aquém do ideal. Ele tinha boas habilidades artísticas que foram aperfeiçoadas na Academia Nacional de Design e na Liga de Estudantes de Arte. Ao ver seus irmãos mais bem suscedidos financeiramente, sua mãe pressionou para que Netter investisse seus esforços em uma carreira melhor.
Netter já guardava um interesse pela área e a pressão familiar foi o ponta-pé que faltava para seguir a carreira médica. Ele se formou em medicina pela Universidade de Nova York em 1931. Durante a graduação, não parou de desenhar. Seus cadernos “estavam cheios de ilustrações, pois era a única maneira de se lembrar de tudo aquilo“. O seu grande talento para desenhar conceitos fez com que sempre fosse convidado para ilustrar trabalhos, artigos, palestras e até apresentações dos professores.
Frank Netter troca o bisturi pelos pincéis
Mais tarde, a projeção da sua mãe se mostrou equivocada. Quando Netter completou a residência em cirurgia no Hospital Bellevue em 1933, a Grande Depressão estava assolando a nação norteamericana. O desemprego ficou em alta, as cirurgias eram poucas e esparsas e, nas palavras dele, “se um paciente aparecia por engano, você atendia e ele nem pagava“. Por outro lado, as suas ilustrações estavam fazendo sucesso entre toda a comunidade médica e até entre os anunciantes (indústrias farmacêuticas). Quando um panfleto com uma ilustração sua era divulgado, Frank Netter recebia vários pedidos individuais desejando a mesma ilustração isolada para outros fins.
Foi nessa situação que o Dr Frank Henry Netter (1906 – 1991) trocou o bisturi pelos pincéis. Desde então, aperfeiçoou dia após dia a sua capacidade de observação, de simplificação das estruturas e de representação das funções e das patologias complexas. Ele não desenhava de forma restrita aquilo que via, mas sim o necessário para traduzir conceitos e ideias de forma clara e objetiva.
O Legado de Frank Netter
Netter consultou diversos especialistas das diferentes áreas da medicina para reunir informações ricas e precisas sobre as mais variadas áreas da medicina. Se preocupou também com as nuances que representavam personalidades, dores, sensações e sentimentos frente a traumas e doenças. Humanidade e empatia são ingredientes chave das suas obras.
Esse grande artista médico resumiu bem o que as ilustrações representavam para ele quando disse:
“A ilustração médica tem três funções principais: primeiro, ajuda o estudante ou médico a esclarecer um assunto em sua própria mente. Enquanto esboça, ele obtém uma imagem mental do que está estudando. Nesse sentido, a mão coopera com o cérebro. Segundo, ajuda a transmitir nossas ideias a outras pessoas, como em uma palestra, em uma conversa particular ou em uma conferência ou mesmo em um artigo publicado. Transferimos a nossa imagem mental para o outro, através do papel. Terceiro, serve para preservar ideias para a posteridade, como em um livro ou em qualquer outra publicação”
Frank Netter
Com mais de quatro mil pinturas do corpo humano envolvendo anatomia, fisiologia e patologia, Frank Netter foi considerado o Michelangelo da Medicina e o ilustrador médico mais influente do século XX. Atualmente, há mais de cinquenta publicações com suas pinturas, o que inclui o conceituado Atlas de Anatomia Humana, companheiro de muitos estudantes de medicina pelo mundo.
Saiba mais!
Romero Reveron R. Frank Netter’s legacy. Anatomy. 2014;8:32-35.
Veja outros textos sobre Arte & Cirurgia!