5 Aplicações da Realidade Aumentada e da Realidade Mista na Cirurgia

Realidade Aumentada e Cirurgia: planejamento cirúrgico, navegação cirúrgica intra-operatória, cirurgia robótica, colaboração entre profissionais e treinamento dos novos cirurgiões.

Você já ouviu falar em Realidade Aumentada? Bom, essa é uma das tecnologias imersivas que vêm ganhando destaque em diversas áreas, inclusive na medicina e na cirurgia.



A aplicação pode ser vista no planejamento cirúrgico, na navegação cirúrgica intra-operatória, na cirurgia robótica, na colaboração entre os profissionais e no treinamento dos novos cirurgiões.

5 Aplicações da Realidade Aumentada e da Realidade Mista na Cirurgia

Para escrever esse texto, revisei os seguintes artigos e outras referências que serão citadas no decorrer dos tópicos:

Realidade Virtual, Realidade Aumentada ou Realidade Mista?

Todas elas são tecnologias imersivas que guardam diferenças evolutivas entre si.

A Virtual Reality ou Realidade Virtual (RV) é uma visão gerada por computador de um ambiente tridimensional puramente virtual, ou seja, o que é visto pelo usuário não é real. A tecnologia objetiva a imersão de tal forma que o usuário tenha a sensação de realidade em um mundo virtual. Pensando em games, foram desenvolvidos diversos óculos ou capacete imersivos por empresas como HTC, Oculus e Sony.

A Augmented Reality ou Realidade Aumentada (RA), por outro lado, combina os objetos e interações do mundo real com objetos virtuais 2D/3D. Ou seja, o ambiente real é capturado por óticas ou por vídeos e é acrescido de objetos virtuais para que o usuário perceba uma maior quantidade de informações relevantes. Essa tecnologia pode ser vista no Google Maps e no Google Lens — ao apontar a câmera para uma determinada rua, a imagem é complementada por informações sobre restaurantes e avaliações de outros usuários. Aquele joguinho chamado PokemonGo ficou famoso devido a RA, já que objetos virtuais em 3D (os monstrinhos) eram acrescidos às imagens obtidas do mundo real.

Note que a RV e a RA visam diferentes intensidades de imersão, mas não permitem uma interação simultânea do usuário com o ambiente real e virtual.

Eis que surge o conceito de Mixed Reality, Realidade Mista (RM) ou Realidade Híbrida. Por meio dessa tecnologia, além da percepção dos ambientes virtual e real, o usuário também consegue interagir com ambos simultaneamente. Ou seja, ao mesmo tempo em que opera fisicamente o paciente, pode fazer uso de gestos ou de comandos de voz para abrir um holograma com exames de imagem ou detalhes de prontuário relevantes.

Já a eXtended Reality (XR) ou Realidade Estendida é um novo termo criado para envolver RV, RA e RM, bem como as futuras invenções derivadas dessas tecnologias.

Quais os possíveis equipamentos usados?

Para interação com o ambiente virtual, foram desenvolvidos hardwares que são acoplados à cabeça dos usuários, os Head-Mounted Displays. Há duas formas para mostrar ou reproduzir o ambiente real nesses dispositivos: por meio de uma câmera que reproduz um vídeo (Video See-Through, VST-HMD) ou por meio de lentes (Optical See-Through, OST-HMD). Esta última é uma forma mais direta e consequentemente mais interessante para a assistência cirúrgica em tempo real.

Há uma série de dispositivos OST-HMD desenvolvidos e implementados em vários cenários, inclusive no Centro Cirúrgico. Alguns deles são: Microsoft HoloLens 1 e 2, Magic Leap 1 e 2, Epson Moverio BT-200 e o Google Glass.

Microsoft HoloLens 1 e HoloLens 2

Realidade Aumentada na Cirurgia - Microsoft HoloLens

O Microsoft HoloLens foi lançado em 2016. É o dispositivo mais utilizado no campo da cirurgia assistida por OST-HMD, com um aumento constante dos artigos a partir de 2017. Na sua segunda versão, o hardware recebe atualizações com melhor campo de visão, maior duração da bateria e redução do peso.

Magic Leap 1 e Magic Leap 2

Realidade Aumentada na Cirurgia - Magic Leap

O Magic Leap foi lançado mais recentemente em 2018 e também vem ganhando espaço nos artigos sobre cirurgia assistida por OST-HMD.

Epson Moverio BT-200 e BT-300

Realidade Aumentada na Cirurgia - Epson Moverio BT-200

O Moverio BT-200 foi lançado em 2014 e a nova versão Moverio BT-300, em 2016.

Google Glass (descontinuado)

Realidade Aumentada na Cirurgia - Google Glass

O Google Glass foi o dispositivo mais usado em 2014, mas sua participação foi interrompida entre 2015 e 2017, talvez devido à diminuição do suporte do Google. O dispositivo foi descontinuado em Março deste ano, 2023.

5 Aplicações da Realidade Aumentada e da Realidade Mista na Cirurgia

Tudo é muito interessante e tecnológico, mas… Qual a real utilidade desses equipamentos para um paciente cirúrgico?

1. Planejamento Cirúrgico Pré-Operatório

Por meio da realidade aumentada, é possível criar modelos 3D personalizados para cada paciente, de acordo com os exames de imagem disponíveis. Isso permite simulações pré-operatórias mais precisas, com boas previsões dos resultados cirúrgicos finais. Essa tecnologia já foi usada em áreas como urologia, cirurgia torácica, neurocirurgia, coloproctologia e cirurgia bariátrica.

O artigo abaixo descreve o uso da realidade mista (HoloLens 2) para planejamento pré-operatório e assistência intra-operatória no tratamento de tumores abdominais. Imagens virtuais das estruturas adjacentes e das margens tumorais foram sobrepostas à imagem real do paciente operado, reduzindo tempo cirúrgico.

2. Cirurgia guiada por Imagem ou Navegação cirúrgica intra-operatória

Projeções holográficas sobrepostas à imagem real foram usadas no intra-operatório para auxiliar a navegação cirúrgica em áreas como ortopedia, neurocirurgia, cirurgia vascular, cirurgia de cavidade oral. A realidade aumentada permite a integração precisa dos achados de imagens relevantes (lesões vasculares, margens oncológicas e outras) ao ambiente real. Isso sem a necessidade de desviar o olhar do campo cirúrgico. Veja o artigo:

As aplicações ortopédicas da realidade aumentada são as mais populares. Como exemplo, temos a navegação em tempo real para posicionamento de parafusos e fixadores. Veja o vídeo:

Outro artigo interessante! A Cirurgia de Whipple (Duodenopancreatectomia) laparoscópica guiada por RA mostrou vantagens significativas na identificação de estruturas vasculares importantes, minimizando danos intraoperatórios e reduzindo complicações pós-operatórias, sugerindo que é um método seguro e viável com um futuro brilhante no cenário clínico. Veja:

3. Cirurgia Robótica guiada por Imagem

O reconhecido sistema DaVinci utilizado na robótica possui suporte para uma interface visual interativa. Dessa forma, são usadas técnicas de realidade aumentada para criar objetos 3D relevantes (anatomia do paciente, exames de imagem, dados de prontuário) para serem sobrepostos ao que é visto pelo cirurgião.

Essa tecnologia foi utilizada para planejamento e ressecção de tumores hepáticos. Reconstruções intraoperatórias baseadas em RA e sistemas de rastreamento foram usados para mapear as margens de ressecção e mostrar estruturas vasculares relevantes durante a ressecção hepática. Confira o artigo:

4. Aprimoramento da colaboração

A realidade aumentada pode permitir que as equipes cirúrgicas visualizem e compartilhem informações em tempo real durante uma cirurgia, o que pode melhorar a comunicação e a colaboração entre os membros da equipe, mesmo que de forma remota. Dessa forma, um cirurgião mais experiente pode participar de forma virtual e auxiliar um cirurgião menos experiente durante um procedimento guiado por RA. Curioso, não?

5. Treinamento de Novos Cirurgiões e Simulação Cirúrgica

As experiências imersivas da RA e da realidade virtual podem aprimorar a compreensão, a retenção e a aplicação do conhecimento dos alunos. Algumas das características desse modelo de ensino são o aprendizado experimental, as abordagens personalizadas e adaptativas, a colaboração e a integração. À medida que a tecnologia avança, a aplicação dessas novas tecnologias imersivas na educação promete perspectivas promissoras para as experiências de aprendizagem. Veja o artigo:

Veja só a apresentação do App Visible Body:

Teach Anatomy in Augmented Reality | Human Anatomy Atlas

Vale ressaltar que essas tecnologias ajudam, mas não devem ser usadas de forma isolada. Elas ainda carecem da realidade necessária para formação integral dos cirurgiões (tato, semelhança dos tecidos, soft skills etc).

Bônus: Automação cirúrgica??

E se juntarmos Inteligência Artificial (Machine Learning, Visão Computacional), Realidade Aumentada e Cirurgia Robótica? O que pode resultar? Bom, há artigos a respeito! Tais tecnologias vêm sendo mescladas nos mais diversos modelos de dispositivos mecatrônicos para implementar os resultados cirúrgicos. Veja:

Leia também o nosso texto anterior:

Limitações e cuidados

Apesar das grandes revoluções previstas para o futuro, a RA e a RM ainda são tecnologias em desenvolvimento. Há dificuldades, limites e cuidados que devem ser respeitados.

Desconforto: alguns cirurgiões relataram desconforto devido ao peso e aquecimento provocado pelos hardwares. Algo que deve ser resolvido com as novas versões.

Alto custo: a aplicação das tecnologias imersivas no ambiente cirúrgico custa pode ser dispendiosa e pouco acessível à maioria dos serviços.

Dificuldades técnicas: a integração dessas novidades ao fluxo de trabalho já existente pode ser desafiador.

Ética e Privacidade: a necessidade de dados precisos e confiáveis (informações clínicas e exames de imagem dos pacientes) levanta questões éticas e de privacidade.

Sugestão de vídeo: Augmented Reality in Surgery

Christopher Morley, co-fundador e presidente da Medivis, resume bem as projeções futuras do que vimos até aqui.

Augmented Reality in Surgery | Christopher Morley, Medivis



João Elias

João Elias

Médico pela Universidade Federal de Goiás. Cirurgião pelo Hospital Alberto Rassi. Residente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço no Hospital do Câncer Araújo Jorge. Ilustrador Médico com foco em Anatomia e Cirurgia. Fundador e mantenedor do Café Cirúrgico.

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